Educação bilíngue de surdos, o que é isso?

A educação bilíngue para surdos é uma modalidade educacional que se fundamenta no uso da Língua Brasileira de Sinais (Libras) como primeira língua e na Língua Portuguesa, prioritariamente na modalidade escrita, como segunda língua. Mas ela não se limita apenas ao uso de duas línguas, ela vai além. Este modelo reconhece a surdidade, o ser e estar surdo, não apenas como uma condição sensorial, mas como uma identidade cultural e linguística e por isso, todo o currículo escolar adota a cultura surda como uma importante ferramenta na formação dos estudantes. Sua inserção como modalidade de ensino no Brasil em 2021, por meio da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, representa um marco para os direitos educacionais da população surda. Contudo, ainda existem desafios significativos para sua implementação efetiva. Para ajudar você a conhecer mais sobre esse assunto iremos conhecer um pouco sobre os objetivos e desafios da educação bilíngue para surdos, oferecendo uma visão abrangente sobre sua importância e funcionamento.


O que é a Educação Bilíngue de Surdos?
A educação bilíngue para surdos é uma abordagem pedagógica que valoriza a identidade e a cultura surda, promovendo o uso da Libras como língua de instrução e ferramenta de comunicação principal no ambiente escolar. Paralelamente, a Língua Portuguesa é ensinada como segunda língua, com foco em sua forma escrita. Essa prática visa não apenas à aquisição de conhecimento, mas também ao fortalecimento da identidade cultural e linguística dos alunos surdos.

No caminho para o fortalecimento cultural das comunidades surdas, na educação bilíngue devem ser abordados conteúdos como: literatura surda, arte surda, história dos surdos, movimentos sociais surdos, esportes dos surdos. Sem essas características, mesmo que as aulas sejam ministradas em Libras, a educação não pode ser considerada bilíngue, mas sim apenas um pseudobilnguismo.


Por que uma Educação Bilíngue para Surdos?
A necessidade de uma educação bilíngue surge do reconhecimento da surdidade como uma experiência cultural única. Segundo estudiosos como Ladd (2013), a surdidade representa uma forma distinta de ser e estar no mundo, marcada por experiências visuais e linguísticas que diferem significativamente das vividas por pessoas que não são surdas, ou seja, ouvintes. A partir desse entendimento, a educação bilíngue propõe uma pedagogia que respeita essas especificidades.

Além disso, essa modalidade busca superar a visão deficitária da surdez, que tradicionalmente trata a falta de audição como uma limitação. Em vez disso, valoriza as potencialidades dos alunos surdos, reconhecendo a riqueza cultural e comunicativa da comunidade surda. Este modelo também promove a equidade educacional, garantindo que os surdos tenham acesso a um ambiente escolar inclusivo e representativo. Na escola bilíngue, desde o porteiro até a direção da escola deve ser fluente em Libras para que o ambiente seja realmente inclusivo.


Elementos Centrais da Educação Bilíngue de Surdos

  1. Currículo Adaptado
    O currículo de uma escola bilíngue deve incluir conteúdos que vão além das diretrizes da Base Nacional Comum Curricular (BNCC). Componentes como a literatura surda, a história dos surdos, e as artes e esportes surdos são essenciais para o fortalecimento da identidade cultural dos alunos. Essas disciplinas enriquecem o aprendizado e garantem que os estudantes surdos vejam suas vivências e valores refletidos no ambiente escolar. Tudo isso é um acréscimo aos conteúdos obrigatórios comuns a todos os alunos do país, conforme rege a BNCC.
  2. Pedagogia Visual
    A pedagogia visual é um dos pilares da educação bilíngue, empregando recursos visuais como vídeos, imagens, e materiais multimodais para facilitar o aprendizado. A organização do espaço de sala de aula também é ajustada para favorecer o contato visual, essencial para a comunicação em Libras.
  3. Participação da Comunidade Surda
    A integração da comunidade surda ao ambiente escolar é vital. Parcerias com associações de surdos e a presença de professores e gestores surdos na equipe escolar promovem um ambiente mais representativo e fortalecem o vínculo entre os alunos e sua cultura.
  4. Estimulação Precoce e Apoio às Famílias
    Desde o diagnóstico de surdez, é crucial que a criança seja inserida em um ambiente bilíngue e que sua família receba suporte para aprender Libras. Cursos para familiares e a promoção de eventos culturais ajudam a construir uma relação sólida entre a escola, a família e a comunidade.

Desafios na Implementação
Apesar dos avanços, a educação bilíngue de surdos no Brasil enfrenta desafios significativos. A insuficiência de escolas bilíngues públicas é um dos principais entraves, com apenas 41 unidades em funcionamento no país. Além disso, há uma carência de materiais didáticos que valorizem a experiência visual e de profissionais qualificados que dominem a Libras e as metodologias específicas para o ensino bilíngue. Nesse caso ainda faltam investimentos públicos para que o Programa Nacional do Livro Didático financie a produção de materiais didáticos focados na educação bilíngue de surdos.

Outro desafio é a resistência cultural e institucional à valorização da identidade surda. Muitas vezes, práticas educacionais assimilacionistas, que tentam adaptar os surdos ao modelo de ensino voltado para ouvintes, prevalecem, em vez de promover uma abordagem que respeite as especificidades dos alunos surdos.


Educação Bilíngue e a Sociedade
A educação bilíngue não apenas beneficia os alunos surdos, mas também contribui para uma sociedade mais inclusiva e diversa. Ao valorizar a Libras e a cultura surda, essa modalidade ajuda a desmantelar barreiras de comunicação e preconceitos, promovendo um tipo de inclusão que vai além da presença da Libras e de intérpretes, pois ela contribui para que os alunos surdos tenham as mesmas condições de aprendizagem que os ouvintes tem, algo que fora de uma educação bilíngue nunca acontecerá. Isso se dá, pois mesmo com a presença de intérpretes de Libras traduzindo as aulas, o aluno surdo nunca terá o mesmo aproveitamento que teria em aulas preparadas por professores surdos ou fluentes em Libras.


Concluindo
A educação bilíngue para surdos é uma ferramenta essencial para garantir a inclusão, a equidade e o respeito à diversidade cultural e linguística. Sua implementação requer esforços conjuntos de governos, instituições educacionais e da comunidade surda, mas seus benefícios vão além da sala de aula, influenciando positivamente toda a sociedade.

Promover uma educação bilíngue de qualidade significa não apenas oferecer ensino em Libras, mas integrar plenamente os elementos culturais e históricos da comunidade surda, criando um ambiente que valoriza e potencializa as singularidades de seus alunos. É um compromisso com a construção de um futuro mais inclusivo, onde todos têm a oportunidade de alcançar seu máximo potencial.


Referências

  • BAKHTIN, M. Para uma filosofia do ato responsável. São Carlos: Pedro e João Editores, 2010.
  • BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 2023.
  • CAMPELLO, A. R. S. Pedagogia visual na educação dos surdos. Florianópolis: UFSC, 2008.
  • LADD, P. Understanding Deaf Culture: In Search of Deafhood. Clevedon: Multilingual Matters, 2013.
  • QUADROS, R. M.; KARNOPP, L. B. Língua de sinais brasileira: estudos linguísticos. Porto Alegre: Artmed, 2004.
  • SKLIAR, C. (Org.). Atualidades da educação bilíngue para surdos: processos e projetos pedagógicos. Porto Alegre: Mediação, 2017.

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