“A expulsa” (1880), Antonino Gandolfo
Ninguém nunca saberá o seu nome. Ele não importa, pois a expulsamos da nossa vida, e tiramos até o direito dela possuir uma identificação. Ninguém nunca saberá o que aconteceu. Ela pode ser a jovem abusada pelo pai, expulsa de casa pela mãe diligente com o intuito de preservar a família; pode ser aquela que engravidou das promessas de um sedutor de fala ardilosa e, agora, foi abandonada na rua à própria sorte; pode ser a esposa que fugiu de uma rotina de maus tratos, sentada em um canto da calçada, sem saber para onde ir; pode ser alguém que precisou sair de casa para não ver os filhos morrerem de fome; pode ser uma refugiada que se viu sem casa, sem família, sozinha a nadar no vasto oceano da existência; pode ser alguém que caiu na rua, e que depois irá rir ao contar esse tombo; pode ser alguém que a solidão acertou de tal forma que a derrubou, atordoada, sem saber para onde ir; pode ser a mulher doente, expulsa do convívio dos seus familiares para morrer na rua, esquecida; pode ser a Grande Pária do Universo, a pessoa que saiu um pouco da máquina do mundo e nunca mais conseguiu voltar a ser quem era; pode ser uma das tantas pessoas sem destino que vagam por aí, perdidas, procurando um lugar que as aceite; ela pode ser eu ou você, se a vida tivesse sido um pouco menos piedosa. Precisou sair às pressas, e mal teve tempo para colocar seus pertences dentro da bolsa. Também ninguém saberá qual o futuro da mulher: talvez ela se prostitua, talvez se entregue ao suicídio, talvez busque conforto em entorpecentes. Apesar dessa certeza lúgubre, existe um resto de fé em nós, algo que acredita que, sim, ela vai se reerguer, vai reassumir o leme da própria vida. No entanto, os olhos da mulher, voltados em súplica e perdão para os céus, esperando um Deus ex-machina que nunca chegará, anuncia: aquela é uma pessoa sem futuro, uma das tantas que foram trituradas pelo ato de existir. Boneca sem articulações, marionete cansada, não é mais uma mulher expulsa, e sim um dos tantos rostos que vemos pelas ruas, mais uma pessoa quebrada. Mais um dos anônimos que precisamos esquecer, e que todos os dias morrem diante dos nossos olhos cegos.