Sinto um prazer imenso quando vejo textos viajando – principalmente quando me deparo com alguns dos meus circulando por aí. É uma sensação muito boa. É como se sua prole começasse a andar por conta própria, indo a lugares sem te pedir ou avisar previamente. Simplesmente vão e, depois, lá estão. Você só se dá por conta quando, fortuitamente, dá de cara com aquele texto que não lhe é estranho. Há algo nostálgico naquele encontro. Se o reconhecimento não é imediato e caso o escrito não tenha sido totalmente esquecido, a lembranças vão tomando forma na medida em que aquelas palavras são lidas pelo próprio criador. Se a dúvida ainda persistir, ela é sanada quando da referência ao final do texto – caso tenha sido dado o devido crédito para a fonte original, é claro.
Os textos são estáticos apenas num primeiro momento e por um curtíssimo espaço de tempo, pois, logo após o seu registro, eles adquirem uma espécie de entidade própria. A linguagem é condição de possiblidade para a compreensão, para nos darmos conta de nós mesmos e do mundo, para nos constituirmos enquanto ser. As viagens que são feitas pelos textos podem então ocorrer de diversas formas. Esse fenômeno, processo ou como preferirem chamar, de transmissão de ideias, de pensamentos, enfim, de linguagem, que ocorre por meio das palavras ali postas, estão viajando a todo instante – a cada leitura, a cada lembrança, a cada menção. Aqui, porém, quero chamar a atenção para a viagem do próprio texto enquanto a coisa ali posta em seu formato estruturado: o texto em si, o artigo, o escrito, o conjunto das palavras que formam uma ideia, uma mensagem, uma fala.
Você escreve um texto. Um pequeno ensaio em seu limiar – como esse, por exemplo. O escrito é estruturado, a fim de que tenha um conteúdo, uma mensagem minimamente clara daquilo que se pretende transmitir. A escrita é posta no papel, no caderno, no arquivo de um programa de edição de texto. Até esse momento, a única viagem que o escrito fez foi da mente do autor para ele ali posto. Já a primeira viagem concreta a ser feita depende do próprio autor. É o criador que define se aquilo ficará esquecido numa gaveta ou numa pasta do computador, ou se será enviado para alguém com a finalidade de ser lido, conhecido, discutido, publicado. Se assim for feito, as próximas viagens do texto poderão ser feitas não mais dependendo da vontade do autor.
Pode ser que esse texto seja lido por alguém e compartilhado entre amigos. É uma forma de viagem que o texto faz. Mas, ainda assim, ele permanece o mesmo – na forma original do seu primeiro transporte. Por mais que seja compartilhado em redes sociais, enviado através de mensagens ou acessado diretamente pelo site em que está, ele ainda se situará na sua segunda casa (a primeira é onde ele foi criado – a partir do momento em que ganhou uma forma concreta, ou seja, no arquivo do computador do autor, em seu caderno, em alguma anotação…). É possível ainda que vá além, que tome novos rumos, que se divida em partes para compor outros todos, que seja incluído em outras moradas, que viaje para outros lares.
O texto pode ou não permanecer o mesmo quando realiza essas viagens, mas em sua essência (se me permitem assim dizer como uma forma de licença poética para o uso do termo) assim será.
Pode ser que alguém goste tanto do texto a ponto de querer publicá-lo num site que possua. Para tanto, copiará o escrito e postará numa outra plataforma – referenciando o autor ou o canal como fonte de onde o escrito foi extraído (assim pelo menos sempre se espera que seja feito). Essa é uma forma de viagem completa que o texto faz, transportando-se em sua totalidade. O seu todo é mantido integralmente, uma vez que uma cópia exata de sua forma completa é apenas replicada em algum outro lugar, de modo que a ideia, a mensagem, enfim, o conteúdo, é também mantido.
Há também a possibilidade de apenas um trecho do texto ser citado, referenciado ou utilizado em algum outro lugar. É uma parte do todo que viaja, podendo carregar nessa transposição o essencial do seu conteúdo ou apenas parte dele. Esse parágrafo, por exemplo, pode ser citado em algum outro texto pelos mais diversos possíveis motivos. É uma forma de viagem que o texto faz, pois por mais que seja, nesse caso, apenas a parte de um todo, ainda assim, é a parte daquele todo que constitui o texto, ou seja, a viagem ocorre da mesma forma, principalmente quando a referência é devidamente apontada.
Se formos analisar sob determinado ponto de vista, poderia se dizer que na realidade são cópias do texto que viajam. Não é o próprio texto em si. Mas se for para seguir por esse rumo, acabaríamos regredindo até quando o texto ainda não possui um formato claro, residindo ainda na mente do autor antes mesmo que aquela ideia surja e seja minimamente clareada para quando do processo de escrita. O texto em si, estruturado e finalizado, seria apenas aquele que foi redigido pela primeira vez. Todas a viagens feitas a partir disso se tratariam de viagens de cópias suas. Porém, por outro lado, poderia se argumentar que o texto em sua essência continua o sendo mesmo quando copiado de um lugar para outro. A ideia, a mensagem, o conteúdo continuam sendo os mesmos, uma vez que são o texto. Em o texto o sendo em sua essência, é o próprio texto que realiza essas viagens.
Seja como for, por qualquer perspectiva que a questão seja observada, o fato é que os textos viajam – e isso é maravilhoso.
A viagem dos textos é um fenômeno espetacular que permanece sempre em voga, agradando leitores, comentadores e, claro, autores. Que os textos sigam respirando cada vez mais sadios nas viagens que realizam!
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