Numa manhã, ao despertar de sonhos inquietantes, Bruno Marin deu por si transformado num gigantesco pênis. Doente, roliço e rosa, sentia as pessoas tocarem sua cabeça sem permissão, lamberem-no e chuparem-no. Cresceu, diminuiu, afinou de tanto o esfregarem em tudo quanto é lugar e, por fim, murchou.
— Doutora, vê o que acontece…
— Realmente, ocorreu um encolhimento aqui – analisou enquanto acariciava-lhe a glande.
— Sim, eu realmente murchei… Mas… não é isso… Consegue notar que estou roliço e rosa?
Ao notar a obviedade, a doutora replicou, com inexplicável naturalidade:
— Notei. Bom, pode ser uma virose.
— Virose, doutora? Tem certeza?
Então, ela, sentando-se com um prontuário em mãos, preparou-se para anotar:
— Quando os sintomas começaram, Bruno?
— No trem, às sete horas da manhã, uns atropelavam os outros em busca de um assento vazio. Eu, apoiado nos ferros, senti algo tocar minhas costas. Como não pude virar e ver o que era, continuei parado. “Bela cabeça”, uma voz disse. “Como é?”, eu perguntei. Continuei sem olhar. “Eu disse… bela cabeça! Quero dizer, que cabeção!”. Deu-me uma apalpadela e riu. Minhas duas bolsas ficavam vermelhas a medida em que a moça continuava as apalpando.
— Sim, prossiga. – gesticulou a doutora com as mãos.
— “Que roliço! E grande! E rosa… Que grande roliço rosa!”. Eu não estava ouvindo aquilo. Quer dizer, preferia pensar que não estava ouvindo, que não era para mim. “Minha senhora, está falando comigo?”, perguntei. “Não se faça de tolo… Está um frio danado”, respondeu. “Tolo, frio?”. “Sim… Não vê que está frio? E você está pedindo… Está pedindo mesmo… Aí… em pé… todo descoberto… Roliço… Rosa… Está pedindo”. Foi aí que eu descobri que eu estava roliço e rosa.
— Pedindo? Pedindo o quê, exatamente? — perguntou a doutora.
— “Pedindo o quê, minha senhora?”, questionei. Ela só se contentou em responder: “Você sabe”. Os passageiros me olhavam e trocavam comentários e risadas. “Devia é se dar o valor”, atreveu-se a dizer uma outra passageira, “Você não passa de um pênis nu”.
Mordendo o topo da caneta, a doutora pediu:
— Certo. Continue…
— Prestei queixa na polícia. “O senhor tem que tomar mais cuidado com o fato de ser roliço e rosa”, orientou a policial. “Leve sempre um spray de pimenta e uma roupa adequada”. Aí eu pensei: cara, eu sou um pênis, não uso roupa.
— Bruno, essa história não faz sentido algum. Acredito que tenha procurado a especialização errada.
— Mas estou dizendo a verdade, doutora!
Ela levantou-se, caminhou até à frente de sua mesa e se sentou, ali mesmo. Com um tom irônico:
— Olha, não precisa ter vergonha, aqui é tudo confidencial…
— Não entendi.
— Pode desabafar, Bruno.
— Desabafar?
— Você está triste por que brochou, não é?
— Brochei?
— Isso é natural, acontece… — explicou a doutora.
— Eu não brochei! As pessoas estão me julgando pelo o que eu sou… Você entende isso? Só porque sou roliço e rosa agora mereço ser abusado no trem?!
Em tom de julgamento, a doutora passou dos limites:
— Você acha, então, que se tornou um objeto sexual? É isso? Fique calmo, receitaria uma pílula azul que…
— Não vou ficar calmo porra nenhuma! Você é surda? Ouviu o que eu disse, doutora?