Querida Lua, quantas histórias você já viveu?
Em certa noite chuvosa me debrucei na janela escancarada do meu quarto, fiquei tentando te achar pelo céu e como o tempo estava encoberto, só me sobraram esperanças. Por sorte, no outro dia lá estava você: cheia de vida, se mostrando para o mundo como quem queria dizer “eu conheço todos vocês, mas quantos de vocês param para pensar em mim?”
Você aí de cima nos encarando noite após noite, quase como um Deus, sabendo de tudo e todos. Como um bom Deus e mesmo sem saber, todos passam vários momentos da vida louvando você. Desde os mais apaixonados, que entre fechar e abrir os olhos que antecedem o beijo, ficam lhe admirando, dando o tom certo para um novo amor, até aqueles em momentos de solidão, que só se resolvem com um bom vinho barato, um olhar vazio para o céu quase sem estrelas e você resplandecendo.
A lua é quase o elo da humanidade. Seus avôs, tataravôs e até Julio Cesar antes de cometer algum ato violento deve ter se perdido nas suas crateras misteriosas. Você é este momento que surge às duas horas da manhã de algum sonâmbulo inquieto, você é parceira de diversos crimes e a maior lembrança de que somos muito insignificantes.
Mas é bom lembrar que essa insignificância existe, quanto mais a gente pensa nisso, menos cometemos besteiras como maltratar os outros, nos sentirmos superiores a alguém e até o nosso nível de empatia nos deixa mais… consideravelmente vivos.
A primeira vez que eu te olhei, quer dizer, eu acho que foi assim (sabe como é aquele lance de nunca sabermos se temos uma memória exata ou só criamos tudo aquilo) e te vi como algo fantasioso, quase como que o mundo fosse a realidade e o universo uma tela enorme de cinema. Por muito tempo eu acreditava que ver você de pertinho ia ser tão fantasioso e amigável quanto Méliès te fez. Mas conforme eu cresci, percebi que de longe, você também era bastante confortável.
No distante silêncio que nos separa, já compartilhei diversos momentos com você. Das lágrimas até os amores. Mas o silêncio pleno dizendo tanta coisa por um olhar, essa foi realmente a coisa mais preciosa que eu pude te dar. Creio que muita gente fez o mesmo e isso é mais uma mágica causada pelas coisas cósmicas do universo. Talvez você seja um ponto de equilibro, que recebe energias e as repassa pelo mundo.
Eu to aqui, perdido e certo de tudo, te escrevendo, olhando para você e… essa carta? Vai ser amassada no final da última palavra, eu não preciso te mandar, você sabe tudo o que eu digo toda noite.
Obrigado por compartilhar tantos nadas comigo, que experiência maravilhosa é saber que toda noite, mesmo com nuvens te escondendo, eu posso sentir o teu silêncio apaziguador aqui. Eu mudei muito, mas continuo o mesmo.
Um grande abraço, de um sonhador qualquer.