Querido Robert Johnson, quem é você?
O dia ensolarado fazia a luz invadir o meu quarto e deixava tudo mais preguiçoso e confortável. Era oficial: um domingo completo. Com toda aquela preguiça pesando me vi cantarolando a sua música, quase como um pedido do meu subconsciente para pegar o seu disco e deixar a melodia invadir as paredes do meu quarto e, quem sabe, o dos vizinhos.
O velho disco parecia que não iria tocar mais nada, ele estava riscado e extremamente sujo. Por conta da idade o som também ficava bem sujo e sua voz ficava quase que em segundo plano, deixando os chiados mais altos do que seus acordes demoníacos. Curioso, meu pai chegou para mim e questionou quem era no disco, falei seu nome e mesmo ele sendo um verdadeiro amante da música, desconheceu e apenas disse: “bem legal, é pena não ser tão conhecido”.
Apenas gritei: “Mas ele é!”.
Como alguém tem coragem de perguntar quem é Robert Johnson? Você deveria estar por todo lugar, estampando camisetas, tendo mil biografias diferentes e quem sabe uma minissérie biográfica na Netflix. Mas a maioria continua sem saber da sua influência no blues pela padronização do formato de 12 compassos, do seu mito de ter feito pacto com o diabo na encruzilhada para tocar melhor e do dia da sua morte, quando te acharam uivando no corredor de um hotel. Eu sempre te achei sensacional por isso, seu mito demoníaco supria qualquer rebeldia que um adolescente procura quando quer se sentir “contra o mundo”, mas como tudo que envolve o blues, você era esquecido. Pena que não era rock n’ roll.
É engraçado como se discute muito quem é o assassino do rock, mas ninguém fala de que o mesmo é o próprio assassino do bom e velho blues. Não me interprete mal, eu amo rock assim como eu amo seu estilo, mas o blues sempre teve aquele mito e soava alternativo, algo como um grito liberal das classes que no fim do dia se escondiam nos bares entre um copo e outro.
Eu nunca vi o rock tão vivo como atualmente (se considerarmos viver com liberdade musical para tocar o que quiser e não o que as gravadoras querem). Dá para misturar rock com MPB, pagode, funk, rap e tudo o que surgir por aí. Mas o blues? Se tudo der certo, sobra apenas um festival anual para ouvirmos de modo meio desinteressado, virando um produto exótico.
É por essas e outras que perguntas como quem é você, me deixam um pouco incomodado. Como as pessoas podem saber qual o nome do sexto Beatle, mas não conhecem Robert Johnson?
Com tudo isso, fica a pergunta no ar: se o seu suposto pacto existiu, valeu realmente a pena? Ou o diabo foi mais esperto e o usou para depois ser esquecido pelo subproduto do rock n’ roll? Brincadeiras a parte, você merecia mais, Robert. É uma pena você ser mais um artista amaldiçoado
Agora preciso parar de escrever, porque a energia do blues é tão misteriosa que eu já estou sentindo cheiro de cigarro e olha que eu nem fumo.
Um abraço, de um pensador louco qualquer.
Preconceito racial fez atribuírem o talento de um homem negro ao demônio… Parafraseando Baco Exu do Blues: Tudo que os pretos faziam e diziam que era do diabo até os brancos fazerem também eu vou chamar de Blues…
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