Amarga Neblina, romance de estreia de Fernanda Mellvee tem como tema a descoberta do desejo. Aurora, a protagonista, da noite para o dia se vê obcecada por um excêntrico forasteiro, ao mesmo tempo em que luta para manter o seu casamento de aparências. A história acontece na cidade fictícia de Santa Cruz da Neblina, ambientada na Serra Gaúcha, no início do século XX. A seguir, temos alguns excertos do romance, que foi finalista da edição passada do Prêmio Kindle de Literatura, da Amazon.
“Aurora esperava pela hora de subir as escadas, jogar-se em sua cama e se perder em pensamentos, longe da vigilância da mãe e do olhar servil do noivo. (…) Aurora gostava de se imaginar vagando livre, andando sozinha pelas ruas, sem hora para voltar para casa, caminhando sem destino, sentindo a aragem da noite e o clarão da lua sobre a pele. Sua imaginação não cabia entre aquelas quatro paredes forradas e não necessitava de tantos cuidados.
“Em manhãs assim, Aurora se perguntava por que aquilo que acontecia à noite era sempre tão resguardado, e sua conclusão era sempre a mesma: se as mulheres o conhecessem antes do matrimônio certamente não se casariam, mas por vontade própria. Aurora imaginou que a virgindade fosse cobrada das moças não pela honra da castidade e sim, para que impedisse a recusa. Era essa a explicação que Aurora encontrou para a expressão aborrecida de todas as senhoras casadas que conhecia.”
“Gregory Heresstauss. Cabelos desgrenhados encharcados, o rosto pegajoso de suor e terra. Aurora podia sentir de longe seu cheiro bestial e o álcool que dele emanava assim como o suor pelos poros. No escuro, os olhos do forasteiro eram ainda mais claros, uma visão de fogo-fátuo em meio ao pântano, cuja luz jamais cessava. Aurora soube que aquele fulgor infame a perseguiria ainda por muito tempo.”
“Aurora, que divisara a figura feminina de longe, se juntou à mãe para observá-la melhor. Era o cadáver de uma mulher jovem, a elegância mórbida revelada por pernas e braços descobertos fez com que ela se recordasse dos manequins das revistas da mãe. Devia estar morta há pouco tempo, não havia marcas na pele branca, nem o inchaço dos que permanecem durante dias submersos, e quando lhe afastaram as mechas acobreadas do rosto, Aurora encontrou a mesma expressão que vira no dia em que Amália foi levada a contragosto para a capital.”
Fernanda Mellvee é escritora, mestranda em Teoria, crítica e comparatismo (UFRGS). Traduziu Damas em lavanda, de William John Locke e Quatro contos tchecos. A autora tem contos e poemas publicados em antologias no Brasil e no exterior. Em 2014, venceu o 2º concurso de contos da Feira do Livro de Santo Ângelo-RS. Em 2017, Amarga Neblina, seu primeiro romance, foi finalista da 2ª edição do Prêmio Kindle de Literatura.
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Fonte das imagens: Divulgação/Oblíquo Imagens.