Escrever para…

Para quem é que se escreve? Escrevo para mim ou para os outros? Escrevo para me encontrar ou para encontrar alguém? O que devo localizar pela escrita – ou seria através dela? O tangível é possível pelo riscar do lápis no papel? O concreto é alcançado pelo digitar no teclado? As letras que se lançam no outrora espaço em branco, que juntas formas ideias, desabafos, arrepios, confissões, reclamos, entregas, desejos e críticas, constituem de fato algo ou são meras invencionices de quem as cria? Ou estaria a fantasia na mente de quem as lê? Há sentido possível – um único? Se é dito que o texto, quando pronto, já não mais pertence ao autor, qual a razão de se tentar aprisionar algo ali para que possa ser alcançado por alguém? Ora, aqui já se tem mais uma perspectiva possível da razão da escrita. Busca-se algo ou se lança alguma coisa para que alguém possa encontrar? Haveria sentido em qualquer dessas ideias? Afinal, qual a razão da busca? E qual a razão de se crer que é possível criar algo que alguém busca? E ainda se assim fosse, esse encontro se daria realmente no texto? Nele ou a partir dele? Não seria vã a tentativa de trilhar por qualquer desses caminhos? Não apenas desses, mas também de vários outros possíveis que já foram, estão sendo e ainda serão pensados na mente dos que encontram o conforto na escrita. Vejam só, uma resposta, talvez. De maneira não intencionada, encontrou-se algo possível. O conforto. Mas por qual motivo se busca o conforto? Uma mente atormentada por algo, talvez? Mas esse tormento se manifestaria sempre de igual modo para toda e qualquer pessoa? Não há níveis das coisas? Mais fortes e mais fracas, mais altas e mais baixas, mais pesadas e mais leves – com o tormento deveria ser igual. E deve ser. Mas há também o algo que ocasiona o tormento. O que seria esse algo? Seria constituído por algo concreto ou se trataria de um fenômeno? Percebam que na medida em que se avança, por mais que se esteja num quarto totalmente escuro, andando aos tropeços, aos poucos os cantos das paredes vão surgindo. Eles são percebidos pelo tato, já que a vista está tapada. Esse tipo de coisa não se vê, realmente, apenas se sente. Então avançar é preciso, por mais que não se chegue a lugar algum, mesmo porque se acredita que não há um destino certo ao considerar a inexistência de um ponto final. O fluxo é constante. Contínuo. A roda não para de girar. Mas e o retorno, é possível? E se o privado da visão no quarto escuro quiser voltar ao ponto de origem, ou pelo menos ao primeiro canto de parede que sentiu com as mãos, seria possível? Aí é que entra o texto como fio condutor. O texto permite isso – a ida e a vinda. Se não há um ponto final, pelo menos é possível andar para conhecer parte do lugar em que se está – mesmo que com as mãos e sob constantes tropeços. O texto funciona como o fio que vai sendo lançado na medida em que se avança. É possível largá-lo, se assim se quiser, é claro. Mas o interessante de manter o fio sempre por perto é que se pode retornar aos locais pelos quais se passou outrora. Também é possível tentar compreender posteriormente, com mais experiência adquirida pelas andanças (já não mais tão trôpegas), como é que os nós se deram – resultantes dos emaranhados que se acumulam cada vez mais pelo trilhar em círculo. Seja como for, o processo é sempre proveitoso. Retornando pela trilha do próprio fio, notem que não é possível encontrar a causa do tormento (e se de fato é um tormento, pois isso é apenas uma opção possível dentre tantas não pensadas), a origem da causa desse (o algo que leva a um algo sentido), se o conforto é possível e nem mesmo sequer a resposta para o questionamento sobre a escrita. Poderia ir além, mas não quero. Não agora. Não há resposta, então escrevo!

 


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