OBRA DE ARTE DA SEMANA: Corona ferrea, entre poder e fé


Corona ferrea
, prata, ouro, granadas, safiras, ametistas e esmalte, 15 cm de diâmetro e 5,3 cm de altura, séculos IV-V e século IX. Conservada no Duomo di Monza, Basilica di San Giovanni Battista, Monza, Itália.

A corona ferrea, coroa férrea ou coroa de ferro, em italiano, é um dos objetos de ourivesaria mais importantes do ocidente, tanto por sua ligação com a Paixão do Cristo, quanto como figura de poder real. A coroa de estilo tardo antigo lembra os diademas que faziam parte dos kamelokia, espécies de coroas bizantinas bastante complexas e com pendentes, e os diademas-elmos, tal como o de Constantino, imperador romano fundador de Constantinopla, a futura capital do Império Romano do Oriente.

A história do objeto teria começado em 326, quando em uma viagem à Palestina, Santa Helena, mãe de  Constantino, teria encontrado um prego que foi usado na crucificação do Cristo e mandou fazer um aro para ser inserido no diadema do filho. Entretanto, o aro prateado que vemos no interior da coroa e que fixa as placas de ouro encaixadas por dobradiças, não é de ferro, como sugere o nome da peça, mas de prata, e, claramente, não se usaria um prego de prata, metal precioso e caro, para prender na cruz um homem considerado um arruaceiro, condenado à morte. Segundo a igreja, Santo Ambrósio, no século IV já teria mencionado o aro feito com um prego da coroa do Cristo como fazendo parte da coroa, entretanto, a Encyclopaedia Britannica, mais imparcial, explica que nas descrições mais antigas da coroa ferrea, o aro não aparece ligado à ela, podendo ser, assim, uma adição tardia, talvez do século XII.

A história da coroa está intimamente ligada à rainha lombarda Teodolinda, fundadora da Basílica de São João Batista em Monza, localizada, na época, próxima ao seu palácio. A rainha teria doado um belíssimo tesouro à basílica, e dentre um grande número de peças suntuosas, estaria a coroa que estudamos hoje. É possível que esse objeto de datação complexa e provável composição de diversos períodos, seja ainda mais antigo, uma coroa real ostrogoda ou ainda um objeto de manufatura bizantina, por seu estilo próximo ao da ourivesaria de Constantinopla. Entretanto, é importante lembrar que a arte bizantina, principalmente a ourivesaria e o mosaico influenciaram muitas partes da Europa na época de maior expansão do império, a península italiana sendo uma das mais influenciadas. Ou seja, também pode se tratar de um objeto feito na própria região que hoje é a Itália, seguindo o estilo bizantino.

Além do aro de prata, sobre o qual já falamos, o diadema é composto de seis placas de ouro unidas através de dobradiças. A decoração é bastante rica, composta de flores de ouro em relevo, elementos vegetais em esmalte verde, branco, azul e vinho, e cabochons – pedras preciosas polidas que atestam a influência bárbara na ourivesaria  medieval -, sendo essas granadas, ametistas e safira, e  filigrana – técnica que consiste em fios e bolinhas de metal soldados – nas extremidades dos retângulos. É possível que originalmente fossem mais placas, ao invés de somente seis, pois há uma ruptura nos desenhos que se alternam, além do tamanho bastante reduzido da circunferência do objeto – somente 48 centímetros.

A importância da corona ferrea se deve não somente por sua beleza e suntuosidade, mas também graças à sua importância como relíquia e regalia, ou seja objeto de afirmação do poder real.

O culto oficial à coroa ferrea como relíquia se deu somente em 1576, quando San Carlo Borromeo o instituiu, desfilando os dois objetos que teriam pregos da cruz – um arreio do cavalo de Constantino e o aro da coroa – em procissões por Milão e Monza. Até hoje, no terceiro domingo de setembro, a coroa sai de sua vitrine na capela de Teodolinda, é colocada junto à uma cruz relicário, e atravessa as ruas de Monza.

Diversos personagens importantes, tanto reis da península italiana, quanto soberanos de outras localidades, usaram a coroa em suas cerimônias de coroação. A lenda menciona reis lombardos e Carlos Magno, entretanto, os que certamente foram coroados com ela foram, dentre outros, Frederico I Barbarossa, Carlos V da Espanha e até mesmo  Napoleão Bonaparte. A razão da popularidade da coroa ferrea em coroações se dá pois sua lenda a liga tanto à Paixão do Cristo, ou seja, sugerindo o poder real ou imperial vindo diretamente de Deus, quanto ao poder imperial romano, através da figura de Constantino.

 

Bibliografia/Links:

BIANCHI, M. MUNZI, “L’elmo-diadema : un insegna tardoantica di potere tra oriente e occidente” in Mélanges de l’école française de Rome. Antiquité, vol. 118, N. 1 (2006), p. 297-313.
https://www.persee.fr/doc/mefr_0223-5102_2006_num_118_1_10985

CONTI, « Il tesoro voluto da Teodolinda » in G. GUADALUPI, I grandi tesori : I capolavori dell’oreficeria attraverso i secoli, Bergamo/Torino, Edizione White Star, 1998, p. 198-205.

DESCATOIRE, « L’orfèvrerie et l’émaillerie » in Dossier de l’art, Paris, Faton, No. 152 (Maio 2008), p. 246-257.

 « Corona Ferrea » in Museo e Tesoro del Duomo di Monza, [Online]. Consultado em 08/07/2019.
http://www.museoduomomonza.it/corona-ferrea/

« Il culto del sacro chiodo » in Museo e Tesoro del Duomo di Monza, [Online]. Consultado em 08/07/2019.
http://www.museoduomomonza.it/corona-ferrea/il-culto-del-sacro-chiodo/

 « Il mito e la fede » in Museo e Tesoro del Duomo di Monza, [Online]. Consultado em 08/07/2019.
http://www.museoduomomonza.it/corona-ferrea/la-corona-come-oggetto-2/

« Iron Corwn of Lombardy » in Encyclopaedia Britannica, [Online]. Consultado em 08/07/2019.
https://www.britannica.com/topic/Iron-Crown-of-Lombardy

 « La Corona comme opera d’arte » in Museo e Tesoro del Duomo di Monza, [Online]. Consultado em 08/07/2019.
http://www.museoduomomonza.it/corona-ferrea/la-corona-come-oggetto/

« La Corona Ferrea » in Duomo di Monza, [Online]. Consultado em 08/07/2019.
http://www.duomomonza.it/en/arte-e-collezioni/la-corona-ferrea
« Le incoronazioni » in Museo e Tesoro del Duomo di Monza, [Online]. Consultado em 08/07/2019.
http://www.museoduomomonza.it/corona-ferrea/le-incoronazioni/

Fonte das imagens:

http://www.duomomonza.it/en/arte-e-collezioni/la-corona-ferrea

http://www.museoduomomonza.it/corona-ferrea/il-culto-del-sacro-chiodo/

 

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