É preciso saber contar histórias. Falando ou escrevendo (ou de qualquer outro modo), a descrição de acontecimentos, reais ou ficcionais, merece toda uma atenção. Não é por pouco que se tem concebida a imagem de um bom contador de histórias. É uma figura que recebe o título em decorrência de sua arte. A arte da narrativa. Uns sabem, outros tentam. Na narrativa, algumas vezes somente o esforço não é o que conta. É preciso de algo a mais. Sempre.
Stephen King diz que o escritor deve possuir uma caixa de ferramentas, a qual é fundamental para a arte de contar histórias. A caixa é um exemplo ilustrativo utilizado pelo autor a fim de demonstrar a importância e a necessidade de alguns aparatos para aquele que pretende escrever. Três níveis comporiam essa caixa: no primeiro, estão a gramática e o vocabulário – elementos fundamentais na vida de qualquer escritor que se digne (e aqui a incessante leitura desempenha um papel essencial); no segundo, residem os elementos de estilo do escritor, sendo que as técnicas são aprendidas e desenvolvidas durante o processo de escrita, ou seja, é pelo treino que se aperfeiçoa a arte – e esse é justamente o terceiro nível da caixa, a saber, o próprio ato de escrever.
Tendo uma boa base (hábito de leitura, dedicação, treino, estudo, vontade…), é possível contar uma boa história. Claro que alguns possuem o dom. O talento da escrita, da narrativa, é algo inerente à condição da existência de determinadas pessoas. Mas são casos isolados, raros. Para nós, pobres mortais, resta o rumar nos trilhos escorreitos e não se desvencilhar jamais.
E para que servem as boas histórias? Muitas são as respostas que aqui cabem. Mas vejo que a coisa também vai além do entretenimento. É por essa razão que intitulei o presente escrito de “a arte de contar histórias”. Tomemos um romance como exemplo. Um livro robusto (não digo nem pelo seu tamanho, mas pela profundidade que uma boa história pode alcançar). Qual a razão de se descrever pormenorizadamente fatos e personagens dentro de uma história escrita? Dar vida à arte. Fazer acontecer a arte da literatura. Olhar a vida com outros olhos, possibilitando outros vieses, outros paradigmas, outras perspectivas, outras formas. Enfim, abrilhantar a própria existência. Eis um dos aspectos (para não dizer função – por quê haveria de existir uma função da literatura?) da escrita. Dar vida para a própria vida.
Sigamos com exemplos concretos disso. O filósofo Alain de Botton ilustra a necessidade dos romances tomando como base personagens literários e a hipótese destes serem retratados em manchetes de jornais:
“Imigrante enlouquecido de amor mata filha de senador”
“Adúltera consumista bebe arsênico por fraude em cartão de crédito”
“Cego por fazer sexo com a mãe”
Alain de Botton demonstra que devemos ter mais respeito à complexidade dos indivíduos, evitando assim a “atitude lasciva e condenatória que os jornais raramente hesitam em atribuir a suas vítimas”. Sim, pois as nuances, as idiossincrasias, as particularidades, enfim, a singularidade, são questões que fazem parte de todo e qualquer indivíduo. Os romances auxiliam a compreender melhor toda essa complexidade das pessoas, do mundo e das coisas. Você consegue descobrir a que personagens as manchetes acima se referem? Diz-se de Otelo, Madame Bovary e Édipo Rei respectivamente. Percebe-se que é impossível, ou no mínimo temerário, reduzir a complexidade para algo simples. Um elefante não passa por um buraco de fechadura, assim como uma vida não cabe numa frase de impacto.
As possibilidades de compreensão das coisas podem ser várias. Mas a estrutura se baseia na linguagem. E é através da linguagem que se constroem histórias, tal qual nos romances. Rosa Montero ensina que “escrever ficção é expor à luz um fragmento muito profundo do inconsciente”, pois “os romances são os sonhos da Humanidade, sonhos diurnos que o romancista tem de olhos abertos”. E nesse sentido, o que seriam os romances? A arte de contar histórias posta em prática. Ali, no preto no branco, no registrado, no posto no papel, residem histórias e ensinamentos. Cumpre-nos ir atrás daquilo que o texto esconde ou explicita, desvelando o sentido do que é exposto. Contanto e ouvindo histórias, a postura dessas práticas pode ser tida como uma arte: uma arte necessária para a vida!
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA:
BOTTON, Alain de. Desejo de Status. Porto Alegre: L± Rio de Janeiro: Rocco, 2014.
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KING, Stephen. Sobre a Escrita. 1ª Ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2015.
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MONTERO, Rosa. A Louca da Casa. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Harper Collins Brasil, 2016.
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