Ceda ao descontrole. Deixe o animal tomar conta da sua pele; permita-se que todos os seus desejos saiam à tona. Mergulhe no corpo do outro como se ele fosse uma extensão do seu – submeta a vontade alheia aos seus impulsos, por mais selvagens que eles sejam. Grite até o limite da sua garganta, ria com frenesi, lamba pescoços, seios, torsos, pernas, sexos. Arranhe a sua parceira; tire sangue dela, faça com que seus gritos de prazer se transformem em pavor. Esqueça dos limites que a sociedade estipulou, esqueça da sombra de moralidade que anda ao seu redor dizendo o que é certo ou deplorável, esqueça do seu nome e da sua família e da sua ética e de tudo que lhe transforma em humano. Hoje é a noite do animal: da criatura que se esgueira por debaixo do seu sorriso, do medo que você não confessa nem para o travesseiro, do impulso que lhe faz ter vontade de estraçalhar, de morder, de se impor, de machucar o outro. Liberte-se da sua pele. Deseje o mal ao seu semelhante. Entregue-se ao desejo por tudo que é proibido. O outro não é seu amigo; ele é o inimigo, e deve ser devorado pelos seus dentes famintos, pela sua boca raivosa, pelos seus dedos que, como garras, enfiam-se na pele tenra e extraem dela aquilo que existe de mais sublime e de mais terrível. Encharque-se com o desespero alheio. Sinta-se mergulhar em um oceano de gritos, de gestos repletos de fúria, de beijos que mordem, de dedos que penetram. No ápice do prazer mora a mais intensa das dores, assim como, em todo grito de êxtase, esconde-se o prenúncio do horror. A melhor maneira de perder a Humanidade é afundar-se em outro ser humano até que ele grite, e nem todos os gritos em um bacanal são de alegria. Nem toda a luxúria pode ser perdoada. Bem vindo ao festim dos corpos.
