Quentin Matsys, O banqueiro e sua mulher, óleo sobre painel de madeira, 74x68cm, 1514. Conservado no Museu do Louvre, Paris, França.
Nessa pintura vemos simetricamente posicionados um banqueiro ou cambista que pesa moedas de ouro e sua mulher que observa seu trabalho, distraída de sua leitura santa. Este, na verdade, é o tema central da obra, moralista, que denuncia a avareza e as vaidades humanas.
Um grande número de símbolos contribui para essa interpretação. Primeiramente, a esposa, que ao virar as páginas de uma Bíblia ou livro de orações – há uma ilustração que parece representar a Virgem Maria e o Menino Jesus – se distrai com o trabalho de seu marido que pesa e conta moedas de ouro, um símbolo da avareza e das riquezas terrenas efêmeras. A balança não serve somente para pesar o ouro, mas também para representar o Juízo Final. Além das moedas, ainda há sobre a mesa um recipiente repleto de pérolas; importantes em significado, aqui, não somente por seu valor, mas também por sua ligação com o pecado da luxúria. Ao lado das pérolas, há uma peça delicada de vidro, que lembra a fragilidade da vida. Nesse sentido, temos também sobre a prateleira uma vela apagada, à extrema direita, sobre a cabeça da mulher, que representa a finitude da vida, e uma maçã, sobre a cabeça do homem, que não pode deixar de nos reenviar à maçã de Eva, e, sendo um alimento perecível, anuncia também o final da existência terrestre e a podridão que se apossa do corpo após a morte. Ainda na estante, vemos elementos que fazem referência ao sagrado em oposição ao banal e ao pecado: uma garrafa de água, à extrema esquerda, e, o rosário pendurado, aludem à pureza da Virgem Maria, enquanto logo abaixo, em uma caixa fechada, a divindade estaria escondida.
É importante notar que durante a época que a obra foi criada, o artista vivia na Antuérpia, importante cidade de comércio entre o norte e o sul da Europa, na qual se encontravam mercadores e banqueiros de diversos países que, claramente, precisavam trocar seu dinheiro para negociar. Dessa maneira, também é possível ver a obra como uma cena de gênero, mostrando cenas da vida quotidiana, como era comum na pintura flamenca da época.
Também ao gosto da época são os pequeninos detalhes e cenas escondidos, tal como no espelho convexo sobre a mesa. Espelhos conectando a pintura e a cena representada ao seu exterior eram bastante comuns em pinturas do período, por exemplo, o autorretrato de Van Eyck em seu famoso retrato dos esposos Arnolfini. Aqui, vemos no reflexo a janela que ilumina a sala, junto da qual figura um minúsculo personagem. Atrás do casal, através de uma porta entreaberta, à direita, é possível ver dois homens conversando.
Detalhe da pintura O banqueiro e sua esposa.
Os esposos Arnolfini, de Van Eyck.
Detalhe da pintura Os esposos Arnolfini. O rosário pendurado, inclusive, é bem próximo ao que vemos na estante da pintura e Matsys.
Bibliografia:
Jean-Claude FRÈRE, Primitifs flamands, Paris, Terrail, 2007.
Guillaume KAZEROUNI, “Le prêteur et sa femme” in Louvre, [Online]. Consultado em 09/07/2018. https://www.louvre.fr/oeuvre-notices/le-preteur-et-sa-femme?selection=44836
Fontes das imagens:
fr.wikipedia.org/wiki/Le_Pr%C3%AAteur_et_sa_femme#/media/File:D%C3%A9tail_Metsys_miroir_convexe.jpg
fr.wikipedia.org/wiki/Le_Pr%C3%AAteur_et_sa_femme#/media/File:Quentin_Massys_001.jpg
Uma obra de arte sensacional e uma análise maravilhosa. Parabéns pela qualidade dos seus posts.
Abraço.
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Muito obrigada 🙂
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