Exposição ‘Latência’ de Dee Lazzerini no Museu de Arte Brasileira, na FAAP

Hoje em dia, na arte contemporânea, quase qualquer coisa pode se tornar uma obra de arte ou parte dela, entretanto, poucos artistas usam um material inusitado de maneira tão significativa quanto Dee Lazzerini quando aplica alfinetes em seus corpos artificiais esculpidos em placas de poliuretano.

Em sua mostra solo no Museu de Arte Brasileira, na FAAP, com curadoria de Laerte Ramos, mais de um milhão de alfinetes perfuram e protegem esses corpos de formas diversas, em uma relação ambivalente entre fragilidade e agressividade, simbolizada pelo alfinete, que considera ser sua tinta tridimensional. Esse elemento surge em seu imaginário graças ao ambiente no qual cresceu, em Minas Gerais, cercado por mulheres e suas linhas, agulhas, tesouras e, é claro, alfinetes, inspirando a série Senhoras de pequenos espaços e essa construção de afetos presente em seu trabalho.

Em algumas esculturas de Senhoras de pequenos espaços – assim como na série Constelação -, sua metade inferior é de madeira, transformando-se em poliuretano coberto de alfinetes em direção ao topo, em uma alusão às metamorfoses tão frequentes na mitologia greco-romana, tal como aquela da ninfa Dafne, que se torna árvore para escapar de Apolo. Assim, os títulos das esculturas levam os nomes de personagens de mitologias diversas: D.Hera, D.Medusa, D.Vênus, D.Hermes Afrodita, D.Medusa, da greco-romana; e D.Maat em alusão à deusa da verdade no Antigo Egito.

D.Vênus (2024)

A história desses corpos artificiais – novos seres representados por formas orgânicas que lembram membros e órgãos – começa com os estudos nanobiológicos do artista. Dentista de formação, fez mestrado e doutorado em Engenharia Metalúrgica na área de Biomateriais, dedicando-se ao estudo da nanotecnologia e à construção artificial de matriz extracelular humana. O resultado dessa fusão entre ciência e artes visuais são esses seres híbridos, que causam curiosidade e estranheza, atração e repulsa.

“Os corpos são revelados dentro da placa de poliuretano e, para proteger esses seres, eu construo uma armadura de alfinetes, como uma membrana. Um único alfinete não protege o núcleo, mas milhares, sim”, explica Dee Lazzerini.

O título da exposição, Latência, alude à 111 pequenas esculturas – as quais tive o prazer de conferir em primeira mão no atelier do artista – que surgem pouco a pouco do gesso, conforme seu entorno é esculpido, representando a possibilidade do vir a ser – o que não deixa de lembrar a ideia de Michelangelo de que ele apenas libertava as formas que já estavam no bloco de mármore.

Como explica o próprio escultor:

“Latência é instante anterior à transformação; aquele momento de suspensão que antecede uma revelação. Como se tudo estivesse presente, mas precisasse vir à tona, emergir. É o que se deseja com a chegada do público nesta exposição: o encontro, a fusão, a comunicação na arte.”

A instalação 250g – aludindo ao peso mínimo de um coração humano, sendo também o número de obras expostas na mostra – é composta de 80 esculturas de corações alfinetados em referência aos países mais felizes do mundo segundo a World Happiness Report – algo como Relatório de Felicidade Mundial -, da ONU. Para conseguir colocar a obra que preenche a imensa parede do museu em seu campo de visão, o espectador é convidado a se distanciar – o que observador vê de perto e de longe de uma mesma obra pode ser muito diferente.

Da mesma série IDH – uma referência ao Índice de Desenvolvimento Humano da ONU – o Coração Parassimpático, também repleto de alfinetes, convida os espectadores a participar através do toque, desconstruindo, assim, a ideia do observador passivo frente a uma obra que não pode ser tocada.

Coração Parassimpático (2021)

Por fim, apesar de ser mais conhecido por suas esculturas cobertas de alfinetes, Dee Lazzerini também apresenta na exposição obras audiovisuais e em resina. O destaque é a forte performance Pacto, apresentada através de um vídeo no qual vemos Dee e seu marido, Renato Buratto, junto a um médico e uma enfermeira, e uma escultura na qual um coração preenchido com o sangue do casal é transpassado por um grande alfinete de ouro e jaz fossilizado dentro um cubo transparente de resina – uma referência à entomologia, área da biologia que se dedica aos insetos, frequentemente alfinetados e expostos em conjunto para estudo.

Serviço:
Latência
Dee Lazzerini
Museu de Arte Brasileira – FAAP
R. Alagoas, 903 – Higienópolis, São Paulo – SP
De 14 de maio a 14 de julho
Terça a Domingo das 10h a 21h
Gratuito

Fonte das imagens: Divulgação

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