Virgem com o menino, mosaico, século XI. Katholikon, Monastério de Hosios Loukas, Beócia, Grécia.
Em meio a uma paisagem bucólica de colinas verdejantes, se levanta sobre o monte Hélicon o monastério de pedra fundado por Hosios Loukas, São Lucas, em português, um santo eremita do século X, e considerado Patrimônio Mundial da Humanidade pela UNESCO desde 1990.
O Katholikon, uma das duas igrejas do monastério, é decorado com mosaicos bizantinos representando figuras e cenas religiosas em um fundo dourado e transcendental. Esse tipo de mosaico, especialidade bizantina, existe, sobretudo, em locais sagrados influenciados ou dominados pelo Império Bizantino – Império Romano do Oriente, com sede em Bizâncio ou Constantinopla, hoje, Istambul – e pela cristandade ortodoxa, desde Itália e Grécia até a Rússia. Nesses exemplos de arquitetura religiosa, as representações em suas paredes não estão ali como mera decoração, mas são elementos importantes que reforçam a liturgia, estando extremamente ligados a esta, além de nos informar sobre a história do lugar e do comanditário.
A Virgem com o menino em questão se localiza na abside, logo acima do altar, possuindo assim um significado particular e importante no contexto arquitetônico no qual está inserida. A figura da mulher que deu a luz ao filho de Deus, segurando-o em seu colo, atesta sua encarnação e reforça o mistério da eucaristia, no qual o pão e o vinho se tornam o corpo de Cristo. Ou seja, afirma, ao mesmo tempo, tanto a natureza divina, quanto a natureza humana do Cristo, que, mesmo representado como menino Jesus, se encontra em majestade, totalmente vestido de dourado, bendizendo com a mão direita. No início da Idade Média, houve muita discussão entre os teólogos quanto a esta natureza do Cristo, separados em três correntes distintas: os que viam o Cristo somente como humano (arianismo), os que separavam suas duas naturezas (nestorianismo), e os que defendiam ambas interligadas (diofisismo).
As inscrições que ladeiam a Virgem são as primeiras e últimas letras das palavras Μήτηρ (Méter), à esquerda da santa, e Θεοῦ (Theou), à sua direita, que significam “mãe de Deus”, em grego, a língua de corte do Império Bizantino e da religião ortodoxa. Maria também era chamada de Θεοτόκος (Theotókos), de mesmo significado.
Na imagem, ela está sentada em um banco ricamente decorado, porta vestes azuis e uma auréola sobre sua cabeça. O menino, representado como um adulto em miniatura, está vestido inteiramente em dourado, carrega um rolo de pergaminho na mão esquerda e bendiz com a direita. Sobre sua cabeça, o nimbo cruciforme, ou seja, uma auréola com uma cruz, reservada às figurações do menino Jesus e do Cristo.
Dentre as características típicas dos mosaicos bizantinos estão os rostos alongados, a ausência de volume, a postura majestosa, imóvel e sem de emoções, e o fundo dourado transcendental, atemporal e abstrato, em uso durante os séculos VI a XII. O dourado – conseguido através de folhas de ouro prensadas entre duas pastilhas de vidro, diferente da de pedra usada para as outras cores que compõe os personagens – representa também a luz divina e sua pureza perfeita. Seu brilho equivalente à visão de Deus que cega por sua transcendência, como, por exemplo, o que acontece no episódio no qual Cristo se transfigura no Monte Tabor, mostrando sua natureza divina.
A ideia não era representar os personagens e cenas de maneira real, dado que estão sendo mostrados seres celestes, que jamais se perturbariam seu estado de ordem perfeita em um local sem tempo ou espaço.
Bibliografia:
Tania Velmans, L’image byzantine ou la transfiguration du réel, Hazan, Paris, 2009.
“Monasteries of Daphni, Hosios Loukas and Nea Moni of Chios” in World Heritage Convention. Consultado em 01/05/2017.
http://whc.unesco.org/en/list/537
Fonte da imagem:
By Hans A. Rosbach – Own work, CC BY-SA 3.0, commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=8943679