O que foi que eu fiz? Deus, o que foi que eu fiz? Onde estava com a cabeça quando ergui o cetro contra meu próprio filho e desci certeiro na sua têmpora? Nos meus braços, o calor se despede do corpo jovem, ceifado no auge da sua existência; as mãos encharcadas do sangue daquele que tanto amei ainda estão trêmulas. O instinto agiu mais rápido do que o pensamento; a fúria foi mais intensa do que a prudência. Quando percebi, o demônio da raiva tinha se apossado do meu espírito, e estava atacando o único que sempre esteve ao meu lado, aquele que se jogou na frente quando a lâmina do traidor mirou meu pescoço, o homem preparado para me suceder no trono. A loucura se apossa da minha existência, mas eu estava louco antes do golpe ou ela só se insinua agora? A última lágrima que saiu dos olhos de Ivan ainda contém a dor de ser assassinado por quem amamos. No silêncio do palácio, ninguém escuta meus gemidos de angústia e, mesmo se escutassem, não se atreveriam a aparecer . Todos me temem, pois sabem que as suas vidas valem nada. Nunca me senti tão sozinho como agora, abraçado ao corpo que tanto amei, sabendo que fui o único responsável por sua desgraça. O que mais desejo é aquilo que não conseguirei fazer: voltar no tempo. Impedir a mão assassina antes que ela fizesse a curva na direção dos olhos azuis que, mesmo naquele momento último, ainda estavam repletos de amor e de devoção. Eu errei, Ivan, você pode perdoar o seu velho e irritável pai? Pode dizer para o Criador que foi um lamentável acidente, que a sua morte foi um erro pelo qual irei sofrer o resto dos meus dias? A voz que sai do meu corpo não me pertence, transtornada pelo desespero enquanto admite o crime para as paredes indiferentes: que eu seja amaldiçoado, pois matei meu filho. Eu matei meu filho.
